domingo, 23 de fevereiro de 2014

Os Álbuns Conceituais e Thick as a Brick: O clássico dos clássicos.


Thick as a Brick - Jethro Tull

Ficha técnica:

Banda: Jethro Tull
Álbum: Thick as a Brick
Ano: 1972
Selo: Chrysalis
Tipo: Estúdio

Faixas:
1. Thick As A Brick – Part 1 – 22’39
2. Thick As A Brick – Part 2 – 21’05

Integrantes:
Ian Anderson – voz/flauta/violão/violino/saxofone e trompete
Martin Barre – guitarras e alaúde
Barriemore Barlow – bateria e percussão
Jeffrey Hammond-Hammond – baixo e narração
John Evans – piano/órgão/cravo e sintetizadores
Músico convidado:
David Palmer – arranjo de cordas e condução

[...]

Boa tarde amigos da música inteligente!

Hoje, em tela, uma nova resenha, seguindo na linha do rock progressivo, que corroborará o Jethro Tull, uma das maiores e melhores bandas do gênero, mais especificamente sobre um de seus álbuns conceituais, o clássico "Thick as a Brick".

Para quem desconhece o significado de álbum conceitual, cumpre inicialmente esclarecê-lo; basicamente, trata-se de um álbum com uma ideia única, onde todas as músicas contribuem para a mesma temática. Além de Thick as a Brick, são outros exemplos de álbuns conceituais o clássico  "In the Court of the Crimson King" do King Crimson, os excelentes "2112" e "Hemispheres" do Rush, o pretensioso "Tales From Topographic Oceans" do Yes, além daquela que considero a fase mais criativa do Pink Floyd, com "The Dark Side of the Moon", "Wish you were Here", "Animals" e "The Wall", só para citar alguns exemplos.

E hoje escolhi Thick as a Brick por considerá-lo o maior clássico conceitual da história do rock; neste trabalho, Ian Anderson, líder da banda, esbanjou criatividade, crítica e qualidade musical sui generis ao som do Jethro Tull, uma banda que nascera com uma ideia de Blues Rock e que flertara com o Rock Progressivo, em especial na década de setenta.

Thick as a Brick fora inicialmente idealizado como forma de crítica, por parte de Ian Anderson, a rotulação de seu álbum anterior, "Aqualung" - outro clássico absoluto e maior sucesso comercial da história da banda - como conceitual, já que, evidentemente, Anderson não o via desta forma. Sendo assim, Thick as a Brick veio a mostrar o que, para o referido líder, era realmente um álbum conceitual.

Sua temática traz à baila a má influência que a sociedade moderna e preponderantemente materialista exerce sobre as pessoas, de maneira a não permitir que elas pensem por si próprias. Até onde se sabe, Thick as a Brick é uma gíria que advém do norte da Inglaterra, ora pejorativa à imbecilidade individual.

Liricamente, Thick as a Brick é um poema de pseuda autoria do garoto Gerald Bostock, personagem de Anderson, verdadeiro autor do poema.

Instrumentalmente, o álbum traz elementos da música folk e clássica, com constantes variações de células rítmicas, temáticas harmônico-melódicas e de estilo, por assim dizer.

Conforme supradescrito na Ficha Técnica, a música tema é una e dividia em duas partes. Na primeira parte, Gerald Bostock é uma criança de oito anos, e na segunda parte, é um adulto.

Na introdução, Anderson traz à baila a história que será discorrida nos próximos quarenta e três minutos, criticando a sociedade ab initio, que, para ele, é tomada pela cobiça e pela ganância. As pessoas, para Anderson, agem instintivamente, destarte, irracionalmente, elegendo outras pessoas a pensarem por elas.

Ato contínuo, Anderson se utiliza de uma metáfora para criticar a mutabilidade da sociedade, capaz de se desvincular e substituir crenças religiosas, moral e bons costumes com enorme rapidez e desapego, o que novamente sugere a falta de crítica na contemporaneidade.Nesse prisma, os jovens não são estimulados a formarem uma opinião própria sobre sua própria realidade, tampouco a desenvolverem suas qualidades intrínsecas. O ser humano nasce e é engolido por um sistema que simplesmente estimula o exercício de um trabalho produtivo para a massa, além de costumes preestabelecidos e pré-ordenados que não admitem mudanças. A perversidade é tamanha que, além da falta de crítica e desta espécie de cabresto intelectual, o cidadão é instruído a sentir-se feliz com esta vida.

Metaforicamente, Anderson narra a história de Gerald que, ainda criança, decide tentar lutar contra o sistema, pois admira os poetas que, em seu belo trabalho, buscam alertar a sociedade para uma diferente realidade por meio de sua arte, mas que acabam por ela (sociedade) engolida.

Gerald, no entanto, logo percebe o quão difícil é travar essa luta do agir X pensar, não exatamente optando mas, imperceptivelmente, agindo conforme os ditames sociais, conquistando o poder e induzindo a continuidade do processo de alienação popular. Mais uma vez, a crítica à lavagem cerebral pela qual somos diariamente induzidos é posta em tela.

Utilizando-se de novas metáforas, Anderson critica os hippies, que surgem como uma crítica uniforme a todos que se dizem contra o sistema mas que, no entanto, não lutam para mudá-lo. Ato contínuo, para Anderson, até os que se dizem contra o sistema fazem parte deste, pois ao querer que se acredite em uma crença, ainda que incomum é, de certa forma, outra forma de alienação.

Ainda para o líder do Jethro Tull, o conhecimento é antropológico, enraizado dentro de nós e encontrado também na natureza, portanto, ainda que queiram, o processo de alienação social pode e sempre poderá ser contestado pelo nosso senso crítico. Não à toa, o final de "Thick as a Brick" traz uma espécie de último alerta, por assim dizer,  onde Anderson direciona sua mensagem a todos aqueles que estão construindo a sua própria moral, crença e inteligência, metaforizados pelos castelos de areia - metáfora constante na poesia como um todo - os quais não foram destruídos pela maré, aqui metaforizada pelo senso comum. Sendo assim, a todos aqueles que ainda podem tomar decisões sobre suas próprias vidas devem resistir aos males do senso comum social, num processo de auto-questionamento, onde o cerne deve ser a crítica a restrição da vontade pessoal, o porque das guerras, mortes e violência e, por fim, o porque do receio ao sistema, se juntos e, paradoxalmente individualmente, somos muito mais.

Por todo o exposto, é de se enaltecer a genialidade de Ian Anderson e do Jethro Tull como um todo, por fazer uma crítica tão absolutamente atemporal à sociedade - da política do pão e circo à necessidade da tecnologia e a obrigatoriedade de se ter um iphone - tão voltada para o materialismo e para um conceito individualista, sem se dar conta que há todo um sistema trabalhando para que você seja apenas mais um (another brick in the wall), com um pensamento pré-ordenado, desprovido da capacidade de crítica e, não obstante, que lhe permite acreditar que esta vida lhe é suficiente e, portanto, devemos nos sentir felizes por se utilizar de um cabresto intelectual, sempre em prol do sistema, romanticamente chamado de "bem comum". Neste diapasão, é de se pensar que quaisquer semelhanças entre o feriado que está por vir na semana que vem e o evento que receberemos no Brasil no meio do ano não são meras coincidências.

Thick as a Brick é um dos álbuns que já "nasceu" clássico, um verdadeiro hino da música inteligente. Eu recomendo!

Thick as a Brick - Full Album

Thick as a Brick Live - 2012

Old Jethro Tull

 Enjoy!



 

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